ADENAUER, NERO E O IDOSO
Cícero, sessentão, 40 anos antes de Cristo, escreveu um livro, não lembro o nome – acho que De Senectute, algo assim -- em que faz o elogio da velhice. Ele dizia que todos desejam chegar à velhice, e quando chegam, acusam-na. “Devo grandes agradecimentos à velhice por ter aumentado em mim a avidez da cultura e diminuído a da bebida e da comida”.
Norberto Bobbio, em novo livro sobre o assunto e com título parecido, diz que quem louva a velhice não a viu de perto, concordando mais ou menos com essa história shakespeareana de que a velhice é a segunda infância. Vá lá. Outro dia eu fui a uma entidade pública. Fila enorme. Uma jovem gentil atacou: “Olhe, a fila dos idosos é ali, o senhor tem direito”... Etc.
Então eu passei à frente de todo mundo e fui guerrear com a burocracia. Fiquei matutando com essa condição de “idoso”. Até hoje não me refiz do choque. Já enfrentara fases traumáticas. A dos 40, quando chegamos nos “enta”. A dos 50. Puxa! E agora? Meio século! Chegarei aos 80? E, não faz muito, a dos
Idoso é a senhora sua mãe, me deu vontade de dizer à jovem. Idoso como? Ela sabia da minha idade? Olhou meus documentos? Me viu apoiado em alguma bengala, humilde e curvo como uma vírgula? Pior foi ler o cartaz que orientava a fila: “Gestantes, deficientes físicos e idosos”. O ridículo, a partir de uma certa idade, é como você fica avaro em matéria de tempo. Briga por causa de um mês, de um dia. E os cabelos brancos, mesmo prateados e fartos como os meus?
Minhas filhas acham que, tirando a barba, eu ficaria mais novo. Meu medo é tirá-la (uso barba há 35 anos), melhorar a aparência de velho e ganhar cara de velha. Idade tem dessas coisas. Adenauer salvou a Alemanha aos 82 anos. Nero tocou fogo em Roma aos 35. E a verdade é uma só: -- a gente sempre envelhece, mas raramente amadurece. Os antigos diziam haver três sexos (e eu já repeti isso 300 vezes): -- o sexo masculino, o sexo feminino e o sexagenário. Fazer o quê?