sábado, fevereiro 19, 2011

FAZES DA VIDA


O Conde de Houdetot, que vive por aqui em meu escritório, era do século XIX, numa encarnação que me fez o cachorrinho dele. O conde, um gênio, definiu as três fases da vida humana nestas três indagações, a que deu as respostas adequadas:


-- Que é preciso, aos 20 anos, para ser feliz? Um raio de esperança. Aos 40? Um raio de glória. Aos 60? Um raio de sol.


Um raio já me pegou uma vez em Teresina, terra de raios e trovôes assustadores, daí o nome antigo da cidade – Chapada do Corisco. Como se vê, não morri. E como só tinha 12 anos, nem me lixei...

INSPIRADORAS


Se Gonçalves Dias (1823-1864) foi infeliz no amor, por não ter casado com a conterrânea de sua paixão, não o foi em amores e em afeições: razão do número de inspiradoras (vide Canção de exílio) que lhe adornaram a existência e o número de companheiros que desveladamente o ampararam tanto na vida quanto na morte.


O grande poeta romântico morreu afogado, em mares maranhenses, na cidade de Guimarães, quando voltava do exílio. Tinha 41 anos. Nosso dicionarista mais famoso, Aurélio Buarque de Holanda, foi quem notou que na imortal Canção de Gonçalves Dias não há um único adjetivo.

A MELHOR DE ARI


Animador de auditório, humorista, locutor esportivo, compositor e político, o mineiro de Ubá, Ary Barroso (1903-1964) ficou famoso em todo o mundo com a sua insuperável Aquarela do Brasil, a música brasileira mais gravada no planeta. Mas, pessoalmente, não considero seu melhor trabalho. A mais bela de suas incontáveis composições é Por causa dessa cabocla, gravada em 1935 por Sílvio Caldas, seu intérprete predileto que também gravou Maria. Ary morreu do coração num domingo de carnaval, no Rio, aos 61 anos.


Falar em Sílvio Caldas, lembra-me que Orlando Silva, em depoimento ao Museu da Imagem e do Som, em 1954 (que tenho em dois CDs gravados por meu amigo e grande conhecedor da MPB, Roberto Lóscio), afirma o seguinte: “Chico Alves tinha voz e não tinha interpretação; Sílvio Caldas tinha interpretação e não tinha voz; então eu tive de entrar com voz e interpretação para chegar aos dois, e dizem que consegui...” Modéstia do Cantor das Multidões em cima do Rei da Voz e do Caboclinho Querido.

Por que morre gente assim, meu Deus?

FALSO MORALISMO


Neste mundo de malucos, ninguém tem mais autoridade moral para se atribuir a condição de puro. Os jornais que agora julgam os excessos da TV já fizeram igual ou pior. A onda de hipocrisia e falso moralismo é tão revoltante quanto a exploração de deficientes físicos na telinha.


Sob o pretexto da “denúncia”, todos os jornais brasileiros já escorregaram na ética e exploram sensacionalmente aspectos “caninos” de nossa realidade. Os meios de comunicação procuram atender ao público e o público, como nós sabemos, não tem rosto, mas tem olhos vorazes e amorais.

BALELA


Jamais acreditei, e peço que ninguém acredite, na balela de que o tráfico toma o espaço que o Estado há muito abandonou, ou jamais se ocupou. Os traficantes atendem a demanda do mercado da droga, e só dominaram as associações de moradores para garantir o seu comércio e a própria segurança, não o bem-estar da comunidade. O tal vácuo deixado pela ausência do Estado continua oco. Bandido nenhum presta assistência.

CLARICE


Estou acabando de ler Clarice, biografia da escritora e jornalista Clarice Lispector (1925-1977), do tipo best-seller, do escritor americano Benjamin Moser (Editora Cosac Naify, 2009). Presente de minha querida amiga Marilda Vale e com mais de 600 páginas, essa obra é um monumento à bela e culta autora de Perto do coração selvagem (1943), seu livro de estréia e talvez o melhor de todos os que escreveu. Era linda. Nascida na Ucrânia (Rússia), a família veio para o Brasil fugindo da guerra, fixando-se em Recife. A pequena Clarice tinha apenas dois meses de idade. Seu texto, mesmo nas centenas de cartas para suas irmãs e os muitos amigos brasileiros, é sempre brilhante. Está entre as primeiras mulheres a exercer a profissão de jornalista, trabalhando na Folha, do grupo Assis Chateaubriand.


Temperamento difícil, isolada em si, adorou tanto o Brasil que acabou sendo naturalizada. Seu marido – e não seu amor – foi o diplomata Maury Gurgel Valente, de conhecida família de latifundiários de Aracati, aqui no Ceará. Como diplomata, ele viajava muito, e foi assim que ela conheceu vários países.


Posso assegurar, sem sombra de dúvida, que Clarice foi uma das escritoras mais notáveis do Brasil e talvez a menos divulgada, daí ser pouco conhecida, apesar de sua obra laureada, da beleza física e da inteligência fora do comum. Morreu aos 52 anos, no Rio de Janeiro, sem saber que sofria de câncer generalizado. Pediu para não ser fotografada morta.

TRÊS LIÇÕES


Primeira – Um livro é um espelho: se um macaco nele se mira, não é a imagem de um apóstolo que aparece.


Segunda – Toda alma humana traz em si uma porção de indolência que a inclina a fazer o que lhe parece mais fácil.


Terceira -- Os santos de madeira têm tido mais influência neste mundo do que os santos vivos.

VOLTAIRE


Sabiam que Voltaire, escritor e filósofo francês, não se chamava Voltaire? Pois Voltaire era apelido. O nome dele, de verdade, era François-Marie Arouet (1694-1778). Nasceu e morreu em Paris, mas a Igreja Católica, que não gostava das críticas que fazia, não permitiu que ele fosse sepultado em um cemitério. A Igreja e suas bobagens. Hoje, os ossos de Voltaire estão no Panteão de Paris, ao lado das maiores celebridades francesas. Ele observava: “Depois de passar meia hora lendo os epitáfios de um cemitério, um amigo pergunta ao outro: “E onde será que eles enterram os canalhas?”

VULGARIDADE


Chove lá fora, e eu aqui com uma vontade enorme de não fazer nada. Quieto, no meu canto, como o urso polar na letargia do inverno. Muito bem. Mas é que o urso não tem o celular perto, gritando por ele, para lhe dizer vulgaridades como as que ouvi há pouco:


-- Tudo bem aí? Já viu a chuva? Isso é o que se quer. Telefonei para saber. Um abraço. Já leu os jornais?

domingo, fevereiro 13, 2011

ANÃO


Conselho de Novalis, poeta romântico alemão dos mais brilhantes, que incorporei ao caderno de minhas lições de vida, no exato momento em que escrevo agora: “Quando vires um gigante, olha para a posição do sol e repara se o gigante que estás vendo não é apenas a sombra de um anão.”

A COMPANHEIRA


Quando me casei, minha mãe disse: “Tenha sempre paciência com sua mulher. Você não vai achar outra igual.” E a paciência é recíproca. Sim, todos nós somos imperfeitos. Mas não sou dos que pensam que o amor passa, o matrimônio permanece. Há uma concordância subjacente, que dá estabilidade ao casamento: aquela que advém da afinidade de espíritos e sentimentos. Que eu sei ter encontrado na companheira que Deus me deu, hoje adoentada, e a quem dou o braço, contente, orgulhoso, assim como há de ser pelo que nos resta da vida.

MÉDICOS


Meus médicos são bons. Tirei-nos na sorte grande. Mas minha conclusão, de resto antiga, é a seguinte: muitos médicos permanecem precisamente no nível mental em que Molière os encontrou no século XVII, mais ralos que café de botequim. Encontrei uma vez, num cemitério de Paris, este epitáfio num mausoléu de mármore preto, coisa de gente rica. Lá estava escrito: “Morri com a ajuda da incompetência de meus médicos.”

MODELOS

Está ficando cada vez mais raro ver alguém bem vestido ou entrar numa casa bem decorada. A mim me parece que todo mundo está de proletário estilizado, de blue jeans, aspirando, quando muito, a uma aparência de unissex.

Se vê gente vestida de maneira cara em lugares públicos, mas, em geral, é tudo gritante e descombinado. Ninguém, exceto modelos, se veste como modelo, mesmo porque é difícil alguém de corpo de modelo, feminino ou masculino.

O COMETA HALLEY


Vou contar uma história. Eu e meu velho amigo Xara Barroso, a quem só Deus pode derrotar, passávamos nossos finais de semana na fazenda dele, Jacurutu, ali pela periferia de Canindé, a 9km da BR. Num desses dias, 5 de março de 1986, havia uma motivação espetacular: a passagem do Cometa de Halley, que só aparece a cada 70 anos. O horário previsto pelo pessoal da Nasa era entre 22 ou 23 horas. Nós nos preparamos para o grande acontecimento. Na verdade, o mundo todo se preparou.

Mas não houve acontecimento nenhum. Só quem viu o Halley foi o pessoal da Nasa, durante 10 minutos, e o telescópio de 100 polegadas em Las Camapanas, no Chile. Os amigos convidados para assistir ao belo espetáculo reuniram um colossal equipamento de máquinas fotográficas das mais modernas até então. Teve gente que alugou aviões de grande porte para fotografar o cometa a 10.000m de altitude.

Se não vimos o grande cometa, também ninguém viu. Ocorreu o seguinte: a partir das 21 horas, o céu começou a escurecer por causa de nuvens pesadas que começaram a cair em ritmo de tempestade. Incrível. Na hora prevista para o cometa aparecer choveu uma chuva de 170mm, com raios e trovões. E choveu a noite inteira. Eu e o Xara ficamos numa casa da beira da estrada da fazenda, e ele, enorme, com seus 130 quilos, tropeçou em alguma coisa, numa escuridão tremenda, e caiu como um saco de batata.

Sozinho, até hoje não sei explicar dois detalhes: onde arranjei forças para levantá-lo e, mais surpreendente ainda, onde consegui fósforo e lamparina naquele momento. E tome chuva! Chegamos à casa da fazenda, num velho jipe americano, como dois pardais encharcados. Daí em diante, só risadas e gozações.

Hoje, Xara está com 95 anos, ao lado de sua mulher, Maria da Paz (60 anos de casados), não é o mesmo, mas vai ao escritório todas as manhãs, tem sua secretária e ainda trata de negócios ou manda ler a biografia dele que eu escrevi. A fazenda Jacurutu, que chegou a ter 20 mil hectares, foi desapropriada pelo governo, que pagou a preço de banana e ainda ficou devendo C$ 10 mil que o proprietário jamais vai receber.

Restam-nos as nossas lembranças e álbuns de fotografias que organizei nos finais de semana. Xara era apaixonado por sua fazenda, seu imenso açude particular cheio de gordas tilápias e tantos outros peixes, afora a coalhada e o leite mugido que tomávamos às cinco da matina. E o que dizer das sestas nas redes brancas e mais limpas do planeta?

Quanto ao Cometa Halley, jamais o veremos. Só vai aparecer agora em 2052, e até lá, eu, Xara e companhia estaremos passeando nas nuvens do Além, ao som de trompetes angelicais.

ANEDOTAS


Não gosto de anedotas. Acho mesmo o contador de piadas o mais chato dos chatos, principalmente quando, de início, pergunta logo: “Conhece esta?”. E sai com uma que todos conhecemos desde Moisés. O chato desconhece um detalhe: piada tem hora, e é preciso que o grupo esteja em alegre estado de espírito para ouvi-la. Além do que o contador de piada saiba teatralizá-la, com senso de oportunidade, e ele mesmo seja engraçado como pessoa. Piada curta, inteligente, bem contada. Vejam um exemplo.

O sobrinho diz ao tio que tem duas notícias para lhe dar: uma ruim e outra boa. Claro, ele começou pela triste, afirmando que o tio tinha de fazer a amputação das pernas.

-- Bom, essa é a ruim. E a boa?

-- Tio, gaguejou o sobrinho, a boa é que já arranjei comprador para todos os seus sapatos...

sábado, fevereiro 05, 2011

CAETANO


Gosto de repetir o episódio. No rigor da ditadura iniciada em 64, estavam presos no DOI-CODE da Barão de Mesquita, Caetano Veloso, Carlos Lacerda e Mário Lago. Aliás, por qualquer motivo eles e tantos outros eram presos e soltos seguidas vezes.


Passavam o dia conversando sobre faisões, uma das paixões de Lacerda. De repente, entra um tenenteco daqueles arrogantes, arrastando a própria insignificância. Passou a implicar com Caetano, em tom de zombaria, até que perguntou:


-- Olha aqui, “seu” Caetano, ouço dizer lá fora, com meus colegas de farda, que você é veado. Aqui pra nós, sinceramente, o senhor é mesmo veado? Pode se abrir: é veado?


Com calma, ajeitando o vasto cabelo, rindo com o canto da boca, Caetano coçou a cabeça, olhou para o Mário Lago e para o Lacerda, cantarolou meio sem jeito e matou a mosca com impressionante cinismo:


-- Eu, tenente, veado? Que é isso! Nada de veado. Sou apenas civil...

QUESTÃO DE NOMES


O brasileiro tem dessas. Muita gente agride as crianças com nomes ridículos. Formam-se às vezes de sílabas dos nomes paterno e materno e dão um resultado de matar. De onde vem Alceni? Quem sabe, de Álvaro e Cenira. Basta demonstrar. Os exemplos são numerosos. Por gozação, e baseado numa crônica de Oto Lara Rezende, um amigo me passou um e-mail assinando Catacisco, filho de Catarina com Francisco. Primogênito da família. Ficaram nele e aguardaram uma menina, que não chegou nunca. Tivesse chegado, seria Ciscorina. Um horror.

ELSIE


Elsie Lessa (1913-1990) era a princesa e a mais subestimada dos cronistas. Na imprensa brasileira até os anos 70 se podia ter a sorte de encontrar Rubem Braga, seco, sucinto, eufônico, beirando a misantrópico, mas encantado com as mulheres e mascarando seu ceticismo com enorme charme, ou Elsie, uma das mais belas mulheres da imprensa brasileira (a outra foi Adalgisa Nery), contando uma história curta e expressiva

POLÍTICO CONFIÁVEL


Até que ponto um político profissional como Sarney é confiável? Respondo de sola: nenhum. Bem, dirão os defensores da classe (que os há, sobretudo na mídia), há políticos idealistas que não se enquadram no conceito de “político profissional”.


Idealista todo mundo é, inclusive alguns políticos, na medida em que têm “idéias” – sejam lá quais forem. Hitler era idealista, PC Farias também. Um queria dominar o mundo por meio da pureza racial e da força. O outro queria dominar a cena brasileira por meio da corrupção. São duas idéias.


Gigante mesmo é esse José Sarney, que não é do Maranhão, o Maranhão é que é dele. Como a Veja mostrou, ele vem dele mesmo, como governador, nos anos 60, e nunca mais saiu do poder. Está sempre podendo. E agora voltou a presidir o Congresso Nacional pela 3ª ou 4ª vez, cercado, com os filhos, acusados de todo tipo de corrupção. Nunca os acusadores conseguiram provar nada contra eles. São blindados.


Daí não existir a divisão entre políticos idealistas e profissionais. Todos são as duas coisas ao mesmo tempo.

Qual é o preço de mercado de um político profissional, que todos o são? Evidente que não pode ser um preço em dinheiro (em alguns casos até que pode). Não sendo em dinheiro, o preço é que nem a mulher, móbile, qual pluma ao vento, ou seja, não merece a menor confiança.

POLUIÇÃO


O homem já foi à Lua e tem robôs encostando no chão de Marte, abrindo caminho para o pouso humano. Sob a ameaça permanente de uma explosão atômica (vide o pavoroso Irã), foi capaz de criar abrigos seguros para proteger-se das radiações nucleares. Mas até hoje não foi possível descobrir, nem mesmo na própria casa, um local seguro para defender o homem da poluição mental que invade os lares, através dos modernos meios de comunicação.

LIVROS


Estavam lá, na pequena mas seletiva biblioteca de meu pai. Eram os livros que não podíamos ler, proibidos por uma questão de pudor doméstico, tabu ou algo parecido. Vou citar três: O crime do Padre Amaro, de Eça de Queiroz (foto), A Carne, de Júlio Ribeiro, e Nossa vida sexual, de Fritz Kahn.


Tínhamos a nosso alcance a coleção O tesouro da juventude (o livro dos porquês) e a velha e maravilhosa Crestomatia, do Radagasio Taborda, edição de 1935, e a Aritmética Progressiva, de Antônio Trajano, de 1956, já naquele tempo na sua 86ª edição, afora a famosa Gramática Expositiva, de Eduardo Carlos Pereira, que teve mais de 100 edições durante a primeira metade do século XX. Tenho-os preservados como um tesouro, a 77 chaves.


O livro de Fritz Kahn foi um dos grandes libertários da minha geração. Em retrospecto, estou convencido de que havia mais relações sexuais entre os jovens do meu tempo que entre os de hoje. Mas havia o medo do poder sexual da mulher e, não raro, a timidez do aspirante a namorado que não ousava se expressar.


E sexo, claro, não é nada disso. É uma experiência complicada, que poucas vezes dá certo para os dois parceiros. Mais fácil para o homem, que sempre se satisfaz, ainda que mediocremente. Em bom português, tem mulher sobrando e homem, não.

QUE VOZES!


Há um raro CD do tenor sueco Jussi Björling e Bidu Sayão, a única brasileira cantora de ópera de sucesso internacional. Era uma grande voz, no registro do soprano lírica à coloratura. Precisou ir a Roma para que a reconhecessem pelo talento. É com ela que Jussi interpreta o melhor Romeu e Julieta, de Gounod. Disseram-me que Bidu chegou a se apresentar aqui em Fortaleza, no Teatro José Alencar. Não tenho detalhes.


Na minha opinião, Jussi (1911-1960) foi o grande tenor de todos os tempos, maior artista entre os tenores líricos, superior a Caruso e Gigli. Peguem uma gravação qualquer desse tenor maravilhoso e escutem bem os agudos. De fazer inveja ao canto do Uirapuru em plena selva, como reza a lenda.

AOS QUE BEBEM


Jamais me dei bem com qualquer tipo de bebida, por mais que tentasse. Sou o que se chama abstêmio, adjetivo ou substantivo. E olha que, tocando violão, tive meus dias de serenatas, com as moças na janela e noites de lua prateada. Bebida, porém, qualquer que seja, meu organismo não aceita. Se eu insistir, logo é devolvida.


Acho, porém, que com uísque teria sido mais fácil suportar os chatos, principalmente os ricos, e também mais fácil acreditar que todos os homens são irmãos. Sem uísque, minhas faculdades críticas me transformaram num cínico desalmado. É muito feia, física e moralmente, a raça humana.

CRISTO


Ele era moderado. Afinal, adorou que as mulheres lhe lavassem os pés naquelas bodas e, ao ser criticado por Judas, que disse que todo aquele luxo poderia ter passado aos pobres, Cristo deu uma resposta que até hoje deve perturbar frei Leonardo Boff: “Os pobres estarão sempre convosco”. O que não me sugere um manifesto da Teologia da Libertação.

VIOLÊNCIA


Os crimes de morte no Ceará, mais na capital que no interior, e batendo recordes, clamam aos céus porque é mais do que violência e porque não é um fato isolado. Lida-se no Brasil com o cotidiano da morte institucionalizada, como se matam porcos. Com uma diferença: estes gritam, denunciam as regras da natureza que é viver, e os homens não, porque estão dormindo.


Mata-se nas cidades e nos campos. Mata-se no país inteiro e, o que é terrível, o comprometimento de quadros significativos do aparelho policial com o crime. Cria-se uma aliança hedionda, numa contradição trágica. O crime desperta revolta, mas essa revolta passa a ser o próprio crime, e o Estado, responsável pela segurança e ordem pública, transforma-se em algoz do próprio povo e destrói a si próprio.


Onde vamos parar? Ninguém sabe, porque a escalada continua. A situação é tão grave que não se procura mais nem saber se é verdade. Qualquer coisa é possível e crível. O país precisa de idéias, de valores, e entre eles o maior se todos, que foi esquecido, dos direitos humanos, e, nestes, o mais elementar: o direito à vida.