DOR DE CABEÇA E MISTÉRIO
Eis um assunto de que falo com escandalosa autoridade: -- sofri 30 anos de dores de cabeça lancinantes, sem que nenhum médico, um único e escasso médico, descobrisse as causas. Estou agarrado a escrever o livro Memórias de Uma Cobaia. Vou contar tudo, e mais do que tudo, sem citar, por razões óbvias, o nome verdadeiro dos 28 médicos por cujos consultórios desfilei, aqui e no Rio. Alguns competentes e alguns já morreram.
De um lado, eu, doente, do outro um daqueles médicos que enfeitam o consultório com plantas de plástico. O diagnóstico era o de sempre: “Não vejo nada na minha área que provoque essa dor de cabeça, procure o colega tal...”. Etc.Tenho, em meus arquivos, uma montanha de tomografias – da cabeça aos pés, incluindo os sapatos.
A dor de cabeça arrasava-me, e olhem que não fumo e nem bebo. Remédios fortes, vivia dopado. Eu não dormia, como ainda não durmo, vítima de brutal insônia. Consola saber que, um dia, terei a eternidade para dormir. Devo dizer que a dor me apareceu quando eu ainda morava no Rio de Janeiro, na década de 60, trabalhando no IBAM e na Fundação Getúlio Vargas. Continuou quando me transferi para Fortaleza, em fins de 1973, e a pior fase foi na implantação do Diário do Nordeste, em 1981, em meio a fatos que não estou autorizado a contar.
Eu disfarçava ao máximo para segurar o problema, e segurava pouco, dando sinais de duvidosa competência profissional. Os colegas de nada sabiam. Era um inferno conciliar trabalho e dor. Não sei como ainda consegui, durante dois anos, escrever um editorial por dia e mais a coluna Comunicado. Com receio de prejudicar o jornal na qualidade do meu trabalho, então decidi pedir o boné, montei um escritório em casa.
Agora pasmem e vejam como tudo acabou: -- sem médico, sem remédio, sem nada, de repente, não mais que de repente, as dores desapareceram. Simplesmente. Dores de 30 anos. Como explicar? Não sei, e desconfio de que jamais vou saber. E, vocês vêem, não morri e continuo lindo. Se o prédio, hoje, já meio descascado pelo rigor dos anos, tem um abalo aqui e outro ali, a biblioteca está intacta, perfeita. Capaz de ouvir e entender estrelas.