CRENÇA, FÉ, VELHOS DEMÔNIOS ETC.
Devo logo confessar: não sou homem de fé, chegado a milagres, procissões, peregrinações, romarias, essas coisas. Não sou ateu, nem sei bem o que é ser ateu, talvez pergunte ao Fernando Henrique. Não sei se posso dizer – sou agnóstico, até porque acho o adjetivo pernóstico (a rima é proposital).
Acho que, no caso, e em quase todos, sou mesmo é ignorante. Não tenho razões para crer em Deus, mas não tenho razões para não crer
Li, por exemplo, que desde 1858, milhares de curas clinicamente inexplicáveis foram observadas em Lurdes; 65 foram oficialmente reconhecidas pela Igreja Católica como milagrosas. Mas o ritmo parece ter-se reduzido. Menos de 20 foram reportadas nos últimos 50 anos e nenhuma desde 1976. Por que tanta gente vai a Lurdes? São mais de 10 milhões de pessoas de 150 países todos os anos. Mais da metade delas afirma não ter fé.
Por que então ir a um lugar que, em tese, nada lhes diz? Desconfio que nossa época perdeu o sentido da vida. As pessoas procuram Deus sem saber que é a Deus que procuram. Com todos os problemas do mundo, pode parecer ridículo falar de esperança, mas as pessoas ali encontram esperança, como encontram em Juazeiro do Padre Cícero, em Canindé, em Aparecida, em Belém de Nazaré, o Senhor do Bonfim na Bahia, para citar apenas as mais importantes festas religiosas no Brasil.
Todos são atraídos por curas milagrosas. As pessoas encontram um novo sentido de vida, à procura de uma vida melhor. Dia desses, na TV, assisti a um documentário da Igreja Universal, do Bispo Macedo. É uma empresa moderna, estende suas atividades além-fronteiras. Antes de tudo, descobriu um produto extraordinário – vende esperança. Observe-se que não vende objetivamente nada, nenhum resultado, vende esperança. A fita impressiona. Há indícios de deboche e cinismo além do razoável. O sobrenatural costuma exigir pompa e circunstância. A Igreja Universal dispensou-as. Novos tempos, novas técnicas, novos métodos.
Bom, o espaço acabou e não tenho vocação para credulidade em grupo. É perigoso. Não se deve brincar com os velhos demônios. Assim como o divino e as utopias, eles podem estar só adormecidos.