sábado, abril 26, 2008

Machado, o mais puro autodidata


Neste ano do centenário da morte de Machado de Assis, vou escrever algumas vezes sobre ele. Acho que a data vai inspirar textos de meio mundo. Ele, o autodidata completo. Ele, que nos legou o exemplo supremo: tudo quanto sabia, devia a si mesmo. Não tinha sequer o diploma do curso primário.

É bom dizer que cada um de nós é consigo próprio que aprende, sempre que pretende aprender. Para isso, somos nós mesmos os nossos mestres. Tanto faz ser bacharel em direito, doutor em medicina ou engenheiro, como não ser nada, ou ter sido, para que emerja daí o escritor, o pintor, o músico, o escultor, com o pleno domínio de seu ofício.

Euclides da Cunha, logo após a morte do romancista e seu amigo, encontrou nos papéis dele muitas notas de leitura dos clássicos portugueses. O mestre copiava-lhes os trechos seletos, as frases, o emprego das palavras, ao longo de constante aprendizagem silenciosa, e foi isto que o elevou à condição de mestre de todos nós. Ao fim da vida, quando quis aprender alemão, estudou-lhe a gramática, repetiu-lhes os exercícios. Só não a dominou, para lê-la fluentemente, porque a morte lhe interrompeu a aplicação.

Não foi aluno de ninguém, mas de si próprio. Ninguém pôde exibir a glória de ter sido seu mestre.

EU, EU, EU MESMO...


Popularidade ele tem de sobra, sobretudo em meio ao pessoal que lambe rapadura. Na seara oficial e oficiosa, o argumento mais brandido pela turma do continuísmo é politicamente correto: o melhor candidato para a sucessão de Lula é o próprio Lula. Lidera todas as pesquisas em alta popularidade e quase nenhuma rejeição, tem a máquina administrativa a seu favor e, a seu favor, tem a falta de escrúpulo para alterar, em benefício próprio, desde a Constituição até o exaustor da cozinha do Palácio do Alvorada.

E cada vez mais surge esta pergunta na mídia: quem melhor do que ele? A pergunta na realidade é uma resposta: quem, senão Lula, poderá garantir essa frente colossal de interesses da classe dominante? Muita gente ainda acredita que o regime autoritário dos militares durou 21 anos por causa da repressão policial.

Não foi bem assim. Parte da mídia e a quase totalidade da classe política deram sustentação e quadros para os militares ficarem no poder por tanto tempo. Quisessem, teriam ido mais longe.

domingo, abril 13, 2008

ÉTICA E POLÍTICA


Bote o ouvido no chão e fique à escuta: o som público é um permanente assalto ao poder, sem qualquer outro imperativo que não o poder em si. Aprende-se com Lula ser cada vez maior o fosso entre a política e a ética. O terceiro mandato ou a prorrogação, dois itens já lançados ao debate público – e nas consciências – são elementos contraditórios. Ou se é político ou se é ético. Não se pode servir aos dois senhores.

Quando alguém invoca a ética, o mínimo que um profissional responde é que a política tem outros valores, outros fins e, sobretudo, outros métodos. Isso sem falar nos mais primários, que consideram coisa de bocó qualquer apelo à ética. Vejam o nosso Congresso. A paisagem que exibe é um permanente assalto ao poder, sem qualquer outro imperativo que não o poder em si.

Para conquistá-lo, para mantê-lo, não apenas tudo é permitido, mas deve dificultar o processo do poder. Ética seria coisa para filhas de Maria, débeis mentais que não entendem as coisas. O debate sobre o terceiro mandato ou a prorrogação tornou-se banal, como se não houvesse uma Constituição, sobre a qual juraram todos os congressistas e, em especial, o presidente da República. Êta nós!

CATULO



Cantador do sertão, Catulo da Paixão Cearense (que não era cearense, mas maranhense) na verdade jamais andou mata adentro. Viu o luar poucas vezes. Era homem de asfalto. Um dia, levado por amigos, fez uma excursão ao interior de Pernambuco, dormindo numa rede armada em tronco de árvore. À primeira luz da manhã, com ar tresnoitado e o corpo todo picado de mosquitos, pôs o violão no ombro e disse aos amigos:

-- Vou ser franco. Estou voltando. Isso não é ambiente. Sertão, na poesia, vá lá. Ao vivo, nunca. Para mim, chega.


E se arrancou, o grande autor do “Luar do Sertão”.

PIPI

O brasileiro médio, hoje, se levantasse a pata para fazer pipi, fatalmente cairia para um lado e faria pipi em si mesmo.

sábado, abril 05, 2008

NASCIDO COMO JERIMUM, ELE PODE SER TUDO


Se Lula trabalha para Dilma Rousseff sucedê-lo no Alvorada, está com uma respeitável candidata e ao mesmo tempo com duas pedras no sapato: Serra e Ciro. O mineiro Aécio, segundo mostram as pesquisas, comete a babaquice de se aliar ao PT para as eleições municipais e já paga, por antecipação, esse erro político. Onde aparecem Serra e Ciro, ele não consegue sair da terceira posição e às vezes da quarta, quando fica abaixo de Heloísa Helena, do PSOL. Está visto que Lula, com todo o seu impulso popular, terá dificuldades para transferir votos e fazer a poderosa Rousseff subir a rampa.

Ainda faltam mais de dois anos para 2010. Provavelmente Ciro tende a crescer ainda mais e já deixa a impressão de um segundo turno com Serra ou a ministra de Lula. As eleições municipais de outubro próximo podem nos oferecer uma sólida antevisão das eleições presidenciais. Até chegar ao outro lado do rio, devem ocorrer estrondos provocados pelas pororocas de votos a dissolverem expectativas e ilusões. Serra estava feliz. Pensava enfrentar apenas Aécio, uma candidatura que não decola. A preocupação dele, agora, é Ciro Gomes, nascido em São Paulo, criado em Sobral e formado em “eu posso ser tudo”.

TEXTO INTELIGENTE


O Generalíssimo Franco, ainda no poder, mantém à sua volta o aparato e a vigilância ditatorial, com a imprensa contida, a ordem militar. Entretanto, quando se sabe escrever, há sempre um meio de se dizer o que não querem que se diga. Para isso, é preciso ser mesmo escritor. Um exemplo?

Aqui o tenho no admirável cronista que há de ter assustado, por alguns momentos furiosos, a polícia política do general, com o título do artigo, em caixa alta, na primeira página do ABC. Assim – NÃO SEJA FRANCO. Assinado: Conde de Foxá. No corpo do artigo, o elogio da mentira...