Minhas Paixões Literárias
São poucas. Quatro ou cinco. Abro um volume de Humberto de Campos (1886-1034) e lembro que meu pai trazia a revista O Cruzeiro – que circulou de
Membro da Academia Brasileira de Letras aos 34 anos e deputado federal pelo Maranhão, nascido em Miritiba (hoje com o nome dele), perto do litoral maranhense, caladão, introvertido, feio, sem fumar, sem beber, não sei de nenhum outro escritor mais versátil e com tanta popularidade, nos últimos anos de sua vida torturada, ainda que sem nenhum livro traduzido para outra língua. Algumas das suas obras, porém, até provocaram na época uma enorme polêmica, psicografadas pelo médium Chico Xavier, então quase desconhecido.
Em 12 de fevereiro de 1932, era assim que ele gemia, com a ponta da pena: “Eu me sinto sem saúde, sem dinheiro e sem uma afeição, a caminho da cegueira, tão profundamente desgraçado, que chego a encontrar uma espécie de volúpia na minha própria desgraça.”
Era o pássaro cego que já cantava ao cair da tarde.
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Já li, mas não sei onde, e não me crucifiquem por causa disto, que o grande Humberto de Campos gostava muito do nosso Ceará, vindo para cá na segunda metade do ano de 1906. Primeiramente, aportou em Camocim, onde passou alguns dias admirando a bela paisagem arenosa do litoral, da janela do hotel a beira mar. Humberto de Campos apreciava a paisagem as margens da foz do rio Coreaú. Camocim, nessa época, já era importante porto regional e recebia embarcações de grande calado.
Pois bem, Humberto de Campos passou alguns dias em Camocim e, depois, resolveu ir para a cidade de Sobral, de trem, ou melhor, de Maria-Fumaça, meio de transporte que já existia graças ao trabalho formidável do Engenheiro Dr. José Privat, que foi um grande impulsionador do sistema ferroviário cearense, como também
devido o esforço empreendedor do Presidente da Província, Dr. José Júlio de Albuquerque Barros, que bateu o primeiro grampo nos trilhos. Graças, também, ao espírito solidário de D. Pedro II, de ajudar o seco nordeste.
Em Sobral, Humberto de Campos ficou admirado com o desenvolvimento da cidade, com os costumes do povo e com a beleza das moçoilas do lugar. De lá, foi passear em Massapê(minha terra querida). Mesma admiração pelas moçoilas. Quando esteve em Massapê, apesar da pouca idade, foi recebido por Diogo Lopes de Aguiar, Intendente nomeado, pois estávamos em pleno Regime do famigerado Nogueira Accioly, o Babaquara.
Mas o objetivo de Humberto de Campos, em terras cearenses, era a busca de um clima
ameno que favorecesse o seu precário estado de saúde. Assim, seu destino já estava traçado, era a cidade de Guaramiranga. Nessa época, Guaramiranga era distrito de Baturité. Distrito pequeno, pacato, ninguém ia pra lá. Certamente, seria o local ideal para que o escritor pudesse desfrutar das benesses da natureza,repousar, pois o verde era intenso, várias grotas de onde jorravam olhos d’Águas, puros e cristalinos, diferentemente do que se vê hoje em dia, pois devido a especulação imobiliária, nossas matas nativas estão sendo devastadas, principalmente as do Maciço de Baturité.
E, assim, em dezembro de 1906 ele partiu, primeiramente, com destino à Baturité, em Maria-Fumaça, passando por Pacatuba. (adorou saborear a nossa banana seca, que ele desconhecia, da estação de Pacatuba) Guaiuba, Acarape, Antônio Diogo. Achou emocionante ouvir o ranger das rodas da Maria-Fumaça nos trilhos quando ela subia a íngreme Ladeira do Itapaí,soltando um imenso tufo de fumaça e, quando na curva da Ladeira, o nosso escritor que estava no último vagão, pôde observar o esforço do foguista a jogar lenha no forno, para alimentar a Maria-Fumaça, ao som do apito nostálgico da velha locomotiva. Para, finalmente, chegar a Baturité.
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UM PENSAMENTO
"A classe dos crítcos(***) é dividida em doi grupos vulgares e clássicos o dos que procedem do astrónomo de Lafontaine, que só olhava para cima e tombava nos buracos do solo - e são os que vêem sòmente as maravilhas na obra literária; e os que descendem do Cardeal Peretti de Montalto, que só olhava as pedras da terra - e que são os que não procuram, no livro, contemporâneo ou antigo, senão os defeitos que o afeiam"
(Humberto de Campos)
(ortografia original)
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OBSERVAÇÕES:
Ora, todo mundo sabe quem foi o Jean de LA FONTAINE(Château-Thierry, Champagne, 1621 - Paris,1695) foi um escritor, poeta e fabulista francês. Era mais conhecido pelo gênero literário fábula, as quais escreveu: "Lebre e a Tartaruga", "O Carvalho e o Caniço". "O Homem", "O Menino e a Mula", "O Leão e o Rato".
- Cardeal ALESSANDRO PERETTI DE MONTALTO, Ele era sobrinho do Papa Sisto V, foi Administrador Apostólico de Viterbo, com apenas 17 anos. Mais tarde tornou-se Cardeal Alessandro Peretti di Montalto.
Foi este jovem que completou o projecto do Palácio Villa Lante, em Bagnaia, na Itália.
Sua construção foi Iniciada por Giacomo Barozzi da Vignola, continuada pelo Cardeal Gianfrancesco Gambara, e terminado pelo Pretti de Montalto.
- O Cardeal Sisto V, chamava-se Felice Peretti (Grottamare, 1521 – Roma, 1590) . Foi Papa no período de 1585 a 1590. Foi um famigerado juiz do Tribunal da Inquisição.
- Giacomo Barozzi da Vignola (1507a 1573) Arquiteto.
Humberto de Campos chegou a Baturité, aproximadamente às 11h, sol quase a pino. Desembarcou na Estação do Bairro Putiú, bem pertinho do rio do mesmo nome. A estação,ficava um pouco isolada do centro da cidade(hoje faz parte).O Bairro do Putiú, era uma zona alegre, onde pequenas casinhas serviam para "encontros amorosos". Humberto de Campos ficou muito curioso, mas rumou para a cidade. Nas estações de trem daquela época existiam a presença constante de carregadores de "bagagem". Humberto de Campos contratou o serviço de um deles, para levar a sua "mala" de madeira, revestida em couro. Pelo serviço pagou ao carregador uma Pataca, cujo valor 320 réis. Para ser ter uma idéia 320 réis correspondia a uma compra que daria para encher dez potes de água, para alegria do carregador.
A Cidade de Baturité despontava como grande metrópole rural. Muitos nomes importantes já tinham ido até lá, como é o caso de José do Patrocínio, abolicionista, mais conhecido por "Tigre da Abolição", que veio ao Ceará conhecer a primeira cidade que aboliu os escravos no Brasil, Redenção, em 1884. Depois, José do Patrocínio seguiu para Baturité e outras cidades da Serra.
Famosa ficou a cidade por ter recebido a Comissão Científica do Dr. Capanema, acompanhado dos camelos que mandou trazer da Arábia, para ser utilizado aqui no Ceará. A presença dos camelos em Baturité causou um alvoroço terrível. Uns diziam que o mundo ia se acabar, outros diziam que os animais eram enviados pelo Satanás. Os meninotes mais afoitos e corajosos ficavam a cutucar os camelos com varetas, irritando-os, fazendo com que lançassem enormes "CUSPARADAS" nos moqueles.
Assim, Baturité naquela época já despontava como cidade grande, foi nesse quadro que o nosso cornista Humberto de Campos, chegou lá.
(Esta narrativa é fonte de mais de 30 anos de pesquisa, buscando trazer o aclaramento dos fatos e acontecimentos,valorizando a história oral.)
Segundo Humberto de Campos, ele partiu rumo à Guaramiranga, no dia 7 de dezembro de 1906.
Leiamos o que diz o próprio Humberto, ao narrar a sua aventura, em “Contrastes”, intitulado STELLA MARIS:
“Creio que foi Sainte-Beive quem escreveu, a propósito de Benjamim Constant, que o governo mais perfeito, aos nossos olhos, é aquele que dirige o país em que vivemos quando temos vinte anos. Pode-se dizer, talvez, o mesmo, das terras que conhecemos. A terra mais linda do mundo, em que as flores são mais cheirosas e os pássaros cantam mais alto, é aquela em que nos surpreendem os primeiros deslumbramentos da mocidade. E eu tinha precisamente vinte anos quando, naquele 7 de dezembro de 1906, subi, pela primeira vez, a serra de Baturité.
“O dia amanhecera convidativo, como os dias límpidos do inverno carioca. Estendida em um vale, com duas ruas apenas, uma cortando a outra, dando-lhe forma cristã de uma cruz, a vila de Guaramiranga espreguiçava-se, com o seu casario de telha, entre duas linhas de outeiros verdejantes, como um rio de águas vermelhas represado n o alto da serra. De um lado e de outro, nas colinas, os cafezais se alinhavam, abrigados pelas muralhas das matas contra os ventos ásperos do sertão. (...)
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Paramos nesta parte para fazer uma observação.
Deve ter havido engano do ilustre Humberto de Campos com relação a data de sua partida para Guaramiranga. O escritor diz que (...) E eu tinha precisamente vinte anos quando, naquele 7 de dezembro de 1906, subi, pela primeira vez , a serra de Baturité.”
Quando o cronista se refere que subiu a primeira vez a Serra de Baturité, quis dizer que o seu destino era Guaramiranga.
PERGUNTO: Como pode Humberto de Campos ter partido de Baturité rumo a Guaramiranga, no dia 7 de dezembro de 1906 e ter, no mesmo dia, apreciado a beleza do amanhecer na vila Guaramiranga?
Quando Humberto de Campos, em STELLA MARIA diz: “O dia amanhecera convidativo, como os dias límpidos do inverno carioca. Estendida em um vale, com duas ruas apenas, uma cortando a outra, dando-lhe forma cristã de uma cruz, a vila de Guaramiranga espreguiçava-se, com o seu casario de telha, entre duas linhas de outeiros verdejantes, como um rio de águas vermelhas represado do alto da serra”
Entenderam? Para ele ter apreciado o amanhecer do dia 7 dezembro em Guaramiranga, pela lógica, ele ter partido no dia 6 de dezembro, ou então, o que é mais improvável, ter viajado durante a noite. Esta hipótese está descartada, pois poucas pessoas se aventurariam a viajar uma noite inteira - subindo a serra por uma estrada perigosa, tortuosa, íngreme, cheia de abismos e de animais peçonhentos -
naquela época.
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UMA OBSERVAÇÃO:
Em STELLA MARIS, Humberto de Campos inicia sua narrativa assim: "Creio que foi SAINTE-BEIVE quem escreveu, a propósito de Benjamim Constant, que o governo mais perfeito, aos nossos olhos, é aquele que dirige o país em que vivemos quando temos vinte anos."
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Alguém se enganou na ortografia SAINTE-BEIVE. Deve ter sido erro tipográfico, tão comum naquela época.
O Nome correto é SAINTE-BEUVE.
Sainte-Beuve era um famoso crítico literário francês, cujo nome completo é Charles Augustin Sainte-Beuve, nasceu em Boulogne-sur-Mer, 23/12/1804, e morreu em Paris em 13/10/1869.
Sainte-Beuve defendia a tese de que uma obra literária era o reflexo da vida pessoal do escritor.
Concordo, nada mais lógico. Toda produção artística é fruto desse reflexo interior da vida do artista. Apesar da tese de Saint-Beuve ser bem racional, Marcel Proust foi contrário, discordou.
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Continuando o texto STELLA MARIS.
(...) De vez em quando em lençol de bruma, trazido de longe, aparecia no alto de um morro, ensaiando sozinho, no espaço, a dança pagã dos sete véus. Uma rajada mais forte impelia-o, porém, para rumos opostos, e o lenços de névoa rasgava-se, esfarrapava-se, desfiava-se, como uma enorme cabeleira branca, no pente verde da mataria. À entrada da vila, no alto de duas colinas que se defrontam, erguiam-se os dois templos, atalaias de Deus, que a protegiam e abençoavam: a matriz da Conceição, antiga e austera, e, diante desta, a capela da Senhora de Lourdes, graciosa e leve, com o seu companheiro esguio, - a semelhança de uma fina mão de pedra espalmada no horizonte, pedindo bênção ao céu. Renques de palmeiras novas orlavam as duas ladeiras, por onde rolava um rio humano nas manhãs de missa e nas noites de festa.
“Ao amanhecer do dia 8 de dezembro, as duas ruas da vila começaram a encher-se de povo. De instante a instante estacava, à porta do hotel ou das casas de comércio, um grupo de cavaleiros, vindos das fazendas do sertão, ou dos sítios próximos, para o culto da padroeira.
Terminando STTELA MARIS:
(...) à sombra de cada árvore, nitriam cavalos selados, patenteando a fortuna do proprietério no luxo bábaro dos arreios. O sol, galgando, de repente os outeiros, tinha, no céus azul, a alegria rica de uma grande moeda de ouro cunhada na véspera.
Acompanhando a multidão , subi a ladeira da matriz, e penetrei no templo cheio. A missa havia terminado. Estava, porém, no púlpito, à direita do altar-mor, um sacerdote que falava às ovelhas do Senhor. A sua voz, forte, clara, sonora, prendia o auditório heterogêneo, em que se viam roceiras humildes, vestindo chita vistosa, e fazendeiros viajados, com alfinetes de pérola espetado na gravata de seda. O temado sermão era o nome de Maria: Maria, "stella maria": Maria, estrela do mar.
A escolha do assunto deu-me, de pronto, idéia da inteligência do pregador. Nada há que tenha tanto prestígio aos olhos do homem do sertão ou da serra, quanto o mar. Vivendo longe dele, mas sabendo que ele existe, que é tão vasto como o céu, e devora homens, e destrói armadas, e arrrasa cidades, o mar constitui, na imaginação do homem mediterrâneo, uma das formas vivas de Mistério. E Maria, com a sua mão pequenina, amansava esse monstro. Dalila cristã, o poder da sua meiguice é tão grande que ela pode cortar esse Sansão de mil braços a sua ondeante cabeleira de espumas...Basta que ela, "stella maris", estrela do mar, apareça entre nuvens do céu respestuoso, para que o nauta acerte seu rumo, o navio recomponha as suas velas e o pescador, o humilde pescador, - cabrito humano dos outeiros das ondas, - encontre, feliz, o seu porto."
OUTRA OBSERVAÇÃO
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Ainda em STELLA MARIS,na parte incial:
"Creio que foi SAINTE-BEIVE quem escreveu, a propósito de BENJAMIN CONSTANT, que o governo mais perfeito, aos nossos olhos, é aquele que dirige o país em que vivemos quando temos vinte anos."
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BENJAMIN CONSTANT era o político francês HENRI-BENJAMIN CONSTANT DE REBEQUE(Lausana, 25/10/1767 — Paris,08/12/1830) foi um pensador, e escritor.
Não confundir com o nosso BENJAMIN CONSTANT BOTELHO DE MAGALHÃES, (Niterói, 1836 — Rio de Janeiro, 1891)Abolicionista, militar, professor, estadista brasileiro.
Líder da insurreição republicana e “fundador da República Brasileira".
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