sábado, agosto 30, 2008

Augusto dos Anjos, Obra Metafísica


Sim, o brasileiro tem anjo da guarda, e ai se não tivesse. A pesquisa diz, no jornal, que 90% acreditam ter, como têm fé em Deus. Tem gente que garante conhecer o próprio anjo, e não falta quem diga já tê-lo visto. Não vi o meu ainda, talvez pelo peso colossal de meus pecados.

As testemunhas de vista garantem que o anjo é igual a um homem de carne e osso, homem bonito, forte, mas com uma luz que o nimba de espiritualidade. Esqueceram de falar nas asas. Se têm, se não têm. Se têm, andam sempre elegantemente recolhidas. O brasileiro pode ser pobre, feio e doente. Pode até gostar de políticos. Digo mais: pode até gostar de Lula. O mundo é assim mesmo. A coruja acha os filhos dela lindos. Rico, pobre, negro, branco, todos têm direito a seu anjo exclusivo. Sozinho, o brasileiro estaria pessimamente acompanhado hoje em dia. Só pensaria em caraminholas.

O ano da guarda não só faz companhia e conforta, como assiste e aconselha. Diz o povo que o anjo vai embora, se você dorme pelado. Se dorme com sede, o pobre anjo morre afogado, ao tentar beber a água. Pode se afastar por um momento, entrar na política, e lá vai nossa segurança. Feliz foi Augusto, o poeta, que era dos Anjos, como o romancista Ciro, tão diferente de seu homônimo, lírico, introspectivo, delicado vaievém de sentimentos entre a ternura e o humour.

A obra do paraibano Augusto dos Anjos (1884-1914) é estranha, mórbida, escandalizante (ou chegada à escandalização, como diz Dilma Rusself, DD. Chefe da Casa Civil), com uma angústia metafísica cheia de grandeza, apesar dos temas abraçados a doenças, micróbios, a morte, cemitérios, cadáveres, repletos de termos técnicos e científicos, principalmente focalizando medicina e anatomia.

Não sei como poderia ter sido o anjo da guarda do grande poeta que se define assim: “Eu sou aquele que ficou sozinho, / Cantando sobre os ossos do caminho / A poesia de tudo quanto é morto.”