domingo, maio 04, 2008

ALMA AO DIABO


Lembro um político influente que exigiu da Rede Globo a demissão de um coleguinha jornalista que ironizou-lhe os cabelos pintados e o bigode ralo, em tom de simples brincadeira. Mas o fato é que o rapaz perdeu o emprego por causa dessa vaidade besta. Bom, é verdade que todo mundo quer ser jovem, mesmo quando ilude os outros pintando os cabelos.

No íntimo só engana a si mesmo. As pernas cansam, as juntas estalam, sobrevém um certo tédio diante das novidades. No entanto, a sós, a um canto, suspira pelos dias de outrora, com aquela saudade de si mesmo a que se refere Machado de Assis no “Memorial de Aires”. Ao morrer, ele tinha 69 anos, e era bem um velho, na postura, no traje, nos cabelos, na barba, no píncenê de trancelim.

Queria ser conselheiro. O Conselheiro Machado de Assis. Tardando o título, por distração do Imperador, deu-o ao seu derradeiro personagem, o Conselheiro Aires, alter-ego do diplomata que seu autor poderia ter sido.

Eu, de mim, para prolongar a juventude, sem precisar tingir os cabelos, nem o bigode e nem a barbicha, fiz o que fez Dr. Fausto, no poema de Goethe: vendi a alma ao Diabo.